o verão é uma linha horizontal, um horizonte deitado precisamente em cima de si mesmo. é essa perfeita correspondência que as pessoas não suportam. as pessoas não suportam a placidez, a inacção absoluta: têm de fazer algo. e ao procederem assim, postam-se em frente às geometrias puras, de uma maneira excessiva, e estragam qualquer dia e qualquer paisagem. mesmo quando afrontam essa limpidez sagrada de peito aberto, sem aparentes artifícios, estão a mais, ocupam o plano na altura em que nenhuma acção se devia passar, em que nem mesmo se poderia falar de solidão, porque havia muita coisa por todo o lado. mas as pessoas aparecem sempre a sobrepor-se a tudo, a esse todo o lado. como se fossem mais importantes que o mundo, cada uma com o seu peito, com o seu corpo, com as suas sensações voltadas para o lado da representação. isto é terrível, espeta uma cana afiada em cada olho, e sangra, com o mar horizontal ao fundo, esse fio de acontecimento jamais iniciado, apenas anunciado, ou enunciado.
Foto: Pascal Renoux
texto: voj
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