O capitalismo tem conhecido várias etapas, de uma forma muito reducionista sintetizáveis em 3 ( v. Yann Moulier Boutang, "Le Capitalisme Cognitif", Paris, Éd. Amsterdam, 2007):
1) Capitalismo mercantilista e esclavagista - acumulação de tipo mercantil e financeiro - do início do séc. XVI ao fim do séc. XVII;
2) Capitalismo industrial a partir dos sécs. XVIII/XIX, com acumulação do capital físico, e ligado nomeadamente à grande fábrica, de que a cidade de Manchester, por exemplo, foi lugar - protótipo;
3) Capitalismo cognitivo, ligado à digitalização generalizada do mundo (seu evangelho-tipo: agir localmente, pensar globalmente - op. cit., p. 84 - acumulação de capital imaterial), em que nos encontramos.
Sem a consciência da especificidade do período histórico que atravessamos não é possível pensar. Por outro lado, tentar pensar filosoficamente, ou historicamente, sem considerar a chamada economia (prenhe de ideologias muito diferentes entre si) pode ser fatal. Por isso creio que este livro, que estou a ler, dá achegas importantes. Muito esquematicamente, eis os 15 marcadores, como lhes chama Yann Boutang, desta terceira etapa do capitalismo (a que André Gorz, próximo deste autor, prefere ligar o conceito de imaterial - v. "L' Immmatériel", Paris, Galilée, 2002 - esta editora é absolutamente fantástica!), tal como são expostos nas pp. 85 a 94 do livro:
1) Virtualização da economia
2) Digitalização dos dados (passagem ao regime numérico) baseado nas NTIC (novas tecnologias de informação e comunicação)
3) Conhecimento e ciência (=inovação) como lugares estratégicos
4) Progresso técnico "endogeneizado" em cada empresa (paradigma técnico-económico evolucionista)
5) Novo modelo da divisão do trabalho, baseada em critérios cognitivos
6) Economias de aprendizagem
7) Inversão da sequência clássica concepção - produção - comercialização (carácter produtivo do consumo)
8) Dissolução das fronteiras de capital/trabalho e de trabalho qualificado/trabalho não qualificado. 3 "camadas" em toda a mercadoria: hardware (material), software (lógica) e wetware (cerebral)
9) 4º elemento: a netware, ou rede
10) Fim do paradigma de trabalho industrial e da força de trabalho
11) Carácter central da ciência, do "trabalho vivo", tal como "consumo vivo" (bioproductividade da força-invenção)
12) Inovação espalhada por um território ou rede produtiva
13) Crise dos direitos autorais e horizontalização de formas anteriores hierárquicas
14) Núcleo do trabalho inventivo captado fora dos quadros tradicionais, de forma invasiva em relação à "totalidade da vida íntima", por assim dizer
15) Bioprodução, sociedade do conhecimento: mobilização da força-invenção (em vez da força de trabalho anterior). É o biopoder referido por Foucault levado a um ponto exacerbado
Nota, mais uma vez: este esquema muito simplificado (por mim), retirado da leitura do livro acima referido, não é entendível sem a mesma leitura. Recomendo a quem possa, pois se trata de uma obra muito importante.
1 comentário:
É sempre bom ter suas excelentes recomendações de leituras. Nunca saio daqui a mesma pessoa. Sou bebê-leitor de Foucault. Poderia me orientar nas leituras? Um abraço,
Nilson
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