O poder dos objectos, o poder do mundo que persiste, pode ser o da nostalgia: ali está a almofada em que te sentaste, aqui a cadeira em que te recostavas, tu que morreste. Mas como me relaciono eu com isso? Há o sentimento de uma inadequação, de uma impotência. Esta nostalgia, esta narrativa do irrecuperável, da presença tornada ausência, da apresentação do já irrepresentável, revela que a identidade da consciência do sujeito que procura, medita, sente, está já ausente - eis em que consiste o sublime moderno para Lyotard: uma falta que o sujeito experiencia já como sujeito cindido, irredutível ao uno, mas ainda mantendo uma certa consistência na abordagem dessa perda (Proust, por exemplo).
O sujeito pós-moderno olha a perda com júbilo, e esse é o seu sublime, que poderíamos designar inumano. Há uma radicalização da perda neste júbilo (James Joyce, por exemplo). É a assunção completa por parte do sujeito de que a coerência representável do mundo, de que o seu "realismo", de todos os modos se perdeu (não há, nem é desejável que haja, uma narrativa que o abarque; qualquer totalidade dessas descamba num totalitarismo). Nessa segunda implosão do realismo a nostalgia, que já não tem lugar, pode ser superada pelo júbilo, o júbilo dessa implosão e da pregnância consequente. Onde todos os jogos se revelaram frouxos, inúteis, sem sentido, abre-se a força para a multiplicação de novos lances.
(estas modestas considerações inspiram-se na leitura de um livrinho de divulgação muito simples: "Jean-François Lyotard", de Simon Malpas, publicado pela Routledge em 2003, na colecção "Critical Thinkers").
Sem comentários:
Enviar um comentário