Sempre que digo uma palavra
Ela foge-me para o passado,
Arrastada por um movimento
Forte como o corpo completo,
Em alta voltagem.
As palavras fogem-me para dentro
De um cabelo enorme,
Para o que parece serem os odores
De toda uma adolescência.
Não sei se isso está a acontecer
Numa praia ou num descampado,
Não sei quão altas se erguem aí
As estacas fortes de uma floresta:
Mas vejo ao longe algo,
Muito alto,
Muito forte,
Palavras negras espetadas no solo
Formando círculos enormes,
Monumentos
Que começam nos vales
E se estendem pelo céu.
Vejo jardins
E vejo as estátuas de Adolescentes Gregas
Estabelecidas a espaços bem medidos,
Reunião
Da Geometria do Mundo, que atrai
Com uma força enorme,
Cria centros, pólos, ímans
De onde a palavra emana
Ou onde ela se estampa
Levada pelo tempo, pelo vento,
Como que à procura
Da porta dos estandartes
Da entrada das frases.
Onde as sandálias dos Combatentes
Esperam há séculos, esperam a Ordem
De Comando!
E assim quando tento dirigir o texto
Para a frente, há um volante terrível,
Um volante de vento
Que o arrasta para um couro cabeludo,
Para um ninho ou nicho obscuro,
Uns cabelos femininos,
Que não sei se estão a acontecer
Num recinto, num esporão, num deserto.
Há uma noite aí dentro, e luas
Que nutrem futuros, círculos, espirais.
É uma vaga portentosa,
A desse movimento,
Que arrasta tudo para a Juventude
Das poses absolutas, sonoras,
Definitivas.
O odor que excita as narinas abertas
Dos guerreiros
Esse exército tremendo que espera no passado
Pela ordem, pela palavra, pelo início
Do Sentido!
Há uma tensão de ossos, músculos, tendões:
E é para aí, para trás, que todas as estátuas se viram,
Que todas as palavras fogem
Numa desordem de signos volantes.
Esticam um corpo todo
No seu máximo esplendor,
Na sua indescritível
Energia, exacerbada pelo vento,
Pelos rubores que afloram ao pescoço.
Esticam os arcos com toda a força
Antes das setas se largarem, antes dos brilhos
do Tiro.
É uma máquina tremenda, uma vontade
Do corpo vivo, esticado, com luzes
Nas extremidades:
Com luzes nos pés, nas mãos,
Um corpo todo aberto,
Todo erguido no vento.
E quando eu quero visar para a frente,
Cheio de heróica convicção
E dirijo o peito todo para o horizonte em volta
Pronunciando a primeira sílaba,
Pronto:
Ela vai logo colar-se a uns lábios.
Que eu não sei se estão sobre um campo
Se flutuam no alto de um poste.
Mas há hostes que se põem em movimento
Milhões de homens que correm
Para dentro do um cabelo solto há muitos séculos
Exército enorme que viro ao vento
E diante do qual passo o cavalo-máquina
de sílabas, de pedras, de estacas:
e ao pronunciar a palavra-chave
Algo de terrível acontece,
Algo que é da natureza da Juventude,
Num futuro há muito ultrapassado.
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Foto (rep. aut.): Geoffroy Demarquet
Site: http://source.lab.free.fr/galerie/thumbnails.php?album=lastup&cat=0&page=1
Texto: voj 2008 dezembro, porto
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