Todo o artista, quando se mostra modesto, ou não é artista ou está a ser hipócrita.
O sublime (que é o que o artista persegue, após tantos milénios de discussão sobre o que isso seja), quando acontece, presentifica-se a si próprio, e tal como todo o Sublime, atravessa-nos num susto ou pasmo - é belo e é terrível, desconcerta completamente uma pessoa.
O artista sabe que, quando consegue sê-lo, tem à sua frente um objecto que já não é seu, mas que é digno de ser apresentado na pólis. E quando todos tecem louvores, e comentários, o artista, com um frisson em todo o corpo, deve passar à sombra e voltar à sua oficina, para não ouvir o que sobre a sua obra, através dos tempos, se vai dizer.
O artista orgulha-se de que a sua obra esteja em público, ele precisa de que ela seja admirada.
Mas precisa sobretudo da sombra onde, na sua quietude, outra obra está já a nascer, a trabalhá-lo todo, para aquele momento de espanto poder voltar a acontecer: quando a pobre face mortal do que faz olha frente a frente a face do Indizível, do Irrepresentável. Vale a pena ter nascido, ter sofrido tanto, para esse momento absolutamente indescritível, em que o artista sabe, muito antes de qualquer comentador ou crítico, que a obra que elaborou é uma coisa nova no mundo, uma ruptura, um abismo. Ele sabe isso algumas vezes quando dá por acabada a obra sobre a qual críticos e historiadores irão discretear durante séculos, numa infinita enxurrada de palavras, de erudições, de comentários.
Nesse momento, o artista transcende com instrumentos muito simples a condição dos outros seres que estão na pólis, entretidos no tricot sem fim das impressões e das opiniões, entregues ao (entretidos no) devir sem fim das representações.
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