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se eu tivesse um jardim
havia de lá ter uma árvore,
para a ver crescer:
nem que fosse uma pequena laranjeira
de laranjas de polpa vermelha.
e se essa árvore um dia morresse
eu havia de a enterrar
junto com as suas raizes,
respeitando o sítio.
o mesmo contigo, lucindo,
quando partires, eu gostava de fazer.
gostava de pôr os teus restos
junto à raiz da árvore,
para que eles se infiltrassem no solo
perto de mim.
assim gostava que acontecesse comigo,
com todos os meus seres
mais queridos: poder dispor de um espaço
para cada um, junto da árvore, ou onde jaziam
os restos da árvore e de ti, lucindo,
e poder pensar que ao menos na morte
nos deixavam finalmente livres
olhando-nos uns aos outros nos olhos
deste espanto muito aberto
de estar a morrer todos os dias.
ao menos poder dizer à Suprema Autoridade
aquelas palavras inspiradas nos gladiadores:
ave, malvada vida que nos consumiste nas tuas teias,
aqueles que vão morrer escapam finalmente
aos teus tentáculos!
habitam este jardim,
que ninguém pode comprar ou vender,
olhando-se olhos nos olhos
para toda a eternidade.
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foto do lucindo: António da Silva Pereira
texto: voj porto abril 2009
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