os vagões-restaurante dos grandes comboios
quando passam rentes às extensas superfícies de água
quando ainda não chegou ninguém para se sentar
quando ainda mesmo os talheres não estão sobre as mesas...
pode ser o mar. pode ser o sol. pode ser uma música
que vem da última carruagem e serpenteia até aqui.
podes ser tu a acordar: e que há de mais rente à areia,
ao som do mar fotografado, que uma mulher a despertar?
multiplicada em cada mesa. desdobrada em cada toalha.
chegada súbita e sonolenta como as gaivotas às janelas.
com a alegria que nos toma quando saímos daqui
e vamos para a Europa de carruagem-cama em carruagem-cama.
assim vale a pena avançar! e olhar para o mar em pose.
e olhar para as figuras fotografadas nas paredes, em pose togada.
estais mortos na vossa dignidade de imagens, a vida é isto
avançar ao longo do mar para longe, longe daqui, já.
movimento! e esta sensação de que vamos sós no comboio,
de que este mar é só para nós, para regar de maresia
as tuas pernas, a seda das tuas pernas a saírem do lençol
e a olharem-me, dizendo-me: bom dia, leva-me no mesmo sentido
dos carris, aos longo das linhas que se cruzam na viagem interminável,
puxa as máquinas que agitam os copos que hão-de ser postos nas mesas,
que abanam os castiçais que hão-de ser colocados para o jantar,
vamos perder-nos os dois aqui até eles estarem acesos!
__________________________________________
Foto: António da Silva Pereira
Texto: VOJ Abril 2009 Porto
Sem comentários:
Enviar um comentário