quarta-feira, 28 de fevereiro de 2007

Falta a rede



Em Portugal temos muitos "nós" de qualidade, de excelência.
Mas cada um vive um pouco para dentro de si mesmo, isto é, considera-se o melhor,
e vive tentando afirmar-se, nacional e internacionalmente.
Falta-nos uma ética e uma prática de partilha.
Ora, sem esses elementos, não se sai do casulo, do pequeno nó: a tendência para o enquistamento é óbvia.
Isto aplica-se a todos: desde os mais altos responsáveis até aos estudantes ambiciosos em fase inicial. Salve-se quem puder - e assim não se "salva" ninguém.
É um modo "primitivo" de afirmação e, em última análise, condenado ao impasse.
Não há debate público, não há inter e transdisciplinaridade, as pessoas e as isntituições competem entre si de uma forma primária, não se colocam em rede.
Cada um - cada instituição - quer surpreender os outros com as "suas" obras. Mas há alguma entidade ou pessoa completamente isolada que, a prazo, faça alguma coisa de jeito? Até a actividade do escritor, do pintor, que exige grande reclusão, é a de um ser aberto ao mundo, à experiência, que constitui a sua matéria-prima...
É na circulação, no debate, no confronto, na discussão crítica de projectos, muitas vezes ainda em forma de elaboração (por isso um blog, por exemplo, pode ser tão importante...) - não de "produtos" já feitos - que se consegue chegar a criar uma ecologia da imaginação, da criatividade, do conhecimento, da troca de ideias, da desinibição, superar o cinzentismo burocrático, o fechamento atrofiante e auto-suficiente, e fazer da vida uma experiência mais feliz.
Enquanto um narcisismo primário preponderar, com cada um a querer mostrar que é melhor que os demais, todos seremos menos do que somos.
É na rede, é em rede, que nos entendemos. É partilhando que cada um de nós pode progredir.
Não temos ainda a suficiente massa crítica, é certo - mas essa massa crítica podia crescer se as pessoas e as instituições fossem mais abertas umas às outras.
Assim Portugal não passa de um conjunto de brilharetes, de eventos, que não enraizam, e não têm continuidade. Os seus protagonistas podem ter - ou julgar ter - muita visibilidade. Mas quantas vezes são, por exemplo, considerados, citados, a nível internacional?...
Porque todos já sabemos que começar algo é fácil. Sustentá-lo é muito mais difícil. Ser muito respeitado na sua "aldeia" é bom; na cidade, exige mais trabalho; no mundo globalizado em que trabalhamos actualmente, exige muito de nós. Hoje, uma pessoa, um grupo de amigos, uma equipa, uma instituição, se isolados, não conseguem sustentar-se.
Fazendo muito, aparentemente, fazem cada vez menos. Julgando progredir, estão no mesmo sítio. São fogachos, com que cada um e todos nos entretemos, e assim nos atrasamos cada vez mais.
Dando sentenças, quais gurus paroquiais, enquanto outros fazem. Em rede.
E o mais curioso e óbvio é que estas redes, no curto prazo, nem sempre "promovem" os melhores, mas os mais espertos. Mas estes, no médio prazo, serão afastados da rede, porque a lógica desta é muito exigente. Ou seja, quase tudo mudou neste mundo, mas ainda não há nada que substitua o trabalho, o empenho, a dedicação, o aprofundamento dos assuntos. O sistema descarta os que o servem apenas para o instante, acabando por valorizar os que apostam e arriscam numa formação de muita qualidade e de muito esforço.
E nada há de mais triste do que a auto-complacência (aparente) dos que se julgam muito importantes por "estarem em rede", mas quando a pessoa lhes pergunta: desculpe, e que livros publicou, onde se podem adquirir, ler, consultar? ... não têm resposta.
O trabalho sério (está pressuposto que em rede) é, a prazo, o maior valor, como sempre foi. As pessoas sabem distinguir, mesmo quando fingem não ver.

1 comentário:

Isabel Victor disse...

That is the question !
A Qualidade passa pelas redes, por um conceito de auto-avaliação permanente e pedagógica e por uma correcta (lúcida) Gestão do conhecimento.

Assunto URGENTE !

Sobre a questão da " Qualidade em Museus " - a partir de um estudo de caso e da reflexão sobre a aplicação das ferramentas da Gestão da Qualidade a Museus
Veja-se :

www.aqualidadeemmuseus.net

BlogAbraço