domingo, 18 de fevereiro de 2007

Um poema de Nuno Júdice

Tardes de costura


Nas tardes de outrora, as mulheres de província
juntavam-se a conversar sobre o que havia para
fazer na província. O dia passava por trás da
janela, e não havia nada para fazer na província
a não ser conversar sobre o que havia a fazer
na província. Eu ouvia as conversas dessas
mulheres, e sabia que o que havia para fazer na
província era ouvi-las a conversar, enquanto
faziam e desfaziam a costura da vida. O cheiro
das madeiras das casas de província enchia
a sala; e elas não davam pelo sol que atravessava
o hemisfério, enquanto as suas mãos rodavam
o tempo nos panos que bordavam. Às vezes,
as mulheres de província pegavam nas agulhas
como se fossem as setas que apontavam o
caminho para sair da província; depois, voltavam
a enterrá-las na tela, e era como se estivessem
a bordar o caminho para fugir da província,
enquanto o sol acabava de cair no fim do seu mundo.



Reproduzido de: http://www.aaz-nj.blogspot.com/ (8.1.2007)
com autorização do autor

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