sábado, 17 de outubro de 2009

Pluralidade e unidade








"Todas as técnicas éticas deixam o sujeito moral insatisfeito, porque ignoram a sua unidade; o sujeito não pode contentar-se com uma vida que seria uma sequência, mesmo que ininterrupta, de instantes felizes; uma vida perfeitamente conseguida [réussie] elemento por elemento não é ainda uma vida moral; falta-lhe ainda o que faz dela a vida de um sujeito, a unidade.
"Mas ao inverso, o pensamento religioso,fundamento da obrigação, cria no pensamento ético uma procura de justificação incondicional,que faz com que qualquer acto e qualquer sujeito apareça como inferior à unidade real; reportados a uma totalidade que se dilata até ao infinito, o acto e o sujeito moral apenas têm significado na sua relação com essa totalidade; a comunicação entre a totalidade e o sujeito é precária, porque o sujeito é constantemente transportado à dimensão da sua própria unidade, que não é a da totalidade; o sujeito ético é descentrado pela exigência religiosa."


Gilbert Simondon
"Du Mode D' Existence des Objets Techniques", Paris, Aubier, 3ª ed., 1989, pp. 177-178.
(Trad. minha)

_____________________________

Foto acima: Mosteiro do Escorial, Espanha, biblioteca
Foto voj out. 2009
A glória e independência do interior (como aliás da fachada - não há correspondência entre as duas), típica do espírito barroco, que se encontra tamnbém na ideia da mónada de Leibniz: v. Gilles Deleuze, "Le Pli. Leibniz et le Baroque", Paris, Les Éditions de Minuit, 1988 - um livro fundamental.

2 comentários:

Blogat disse...

Só num interior-"glorioso e independente"- pode se dar a comunhão com a "totalidade" pois enquanto o sujeito ético é descentrado pela exigência religiosa,o sujeito moral(seu interior)pode ser "centrado" justamante pela EXPERIÊNCIA religiosa.Uma vez que necessitamos preservar este interior,com/por todas as experiências marcantes que possamos absorver...a cada um e em todos os dias.A despeito do "resto" das coisas da vida...

Vitor Oliveira Jorge disse...

Respeito a sua ideia. Sugiro (se me permite) uma leitura de um grande conhecedor de teologia - Giorgio Agamben, num livro traduzido em português (pela Cotovia, se não erro), chamado "Profanações".