domingo, 8 de março de 2009

arte contemporânea


Desde pelo menos o início do século XX que a “arte” está em crise... Toda a gente sabe como ela se des-sacralizou e como se esbateram as fronteiras entre as hierarquias tradicionais do mundo erudito, ou do que é canonizado em museu, e do vulgar, kitsch, etc. Não sabemos muito bem como definir as fronteiras desse “campo” dito da “arte”, se é que isso teria algum sentido... Mas, ao mesmo tempo, e graças às comunicações, e tecnologias de produção, muitas novas oportunidades surgem de realização pessoal (auto-produção, auto-publicação, etc) e de grupo através de actividades “expressivas”. A própria automatização progressiva de todos os sistemas que regem a nossa a vida leva à proliferação dessas manifestações, incluindo a cultura de massas, um produto sobretudo da sociedade de consumo do pós-guerra, generalizado hoje a todo o mundo. Há uma acumulação imensa, um miscigenação imensa, mas no meio deste enorme “transbordar” vão aparecendo autores e grupos que sem dúvida marcarão a arte contemporânea de uma forma perdurável. Essa "arte contemporânea" é caracterizável precisamente pela profusão de formas, continuamente anunciadas como novas (a tal ponto que esta palavra "novo" perdeu todo o sentido), de experimentações, de fusões, etc. - pela impossibilidade de se dar dela uma definição geral. O fluido e a deriva tornaram-se quotidianos, neste campo como em todos os outros, dito pós-moderno. Seria tentado a relevar a fotografia, sobretudo agora com o digital, por um lado, e a performance, por outro, como talvez dois dos domínios em que se estão a fazer experiências mais interessantes. A fotografia veio colocar-se ao lado da pintura como uma “grande arte”, que capta cada vez mais adeptos, até porque fotografar é arquivar e estamos numa sociedade obsessionada pelo arquivo. A performance veio instalar-se ao lado do teatro como algo de mais informal e efémero, como uma nostalgia contraposta à do arquivo, e que é a nostalgia da intensidade súbita, do momento único, que não deixa traços. Mas no fundo uma e outra são as duas faces da mesma moeda: a procura de algo que preencha o vazio do desencantamento provocado pelo mundo do consumo e pelas novas formas de alienação a ele ligadas. As feiras de arte proliferam no mundo e os livros também... Só tenho pena que as potencialidades das novas tecnologias não sejam mais aproveitadas no sentido da criação de mercados mais qualificados de obras a que normalmente só têm acesso públicos muito restritos. O que mostra que, quanto mais proliferam as coisas, nomeadamente através da net, mais se criam elites restritas, que se distinguem precisamente, na economia política da cultura, pelo acesso privilegiado ao que é raro. Como sempre, embora com configurações muito diferentes, aconteceu...

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imagem: Michele del Campo
two girls in conversation
(rep. aut.)
site: http://www.micheledelcampo.com/index2.html


1 comentário:

ginha no país das maravilhas disse...

Arte em crise? Não o creio. Gosto dela assim mesmo: desinibida, de rótulo difícil, perto da vida contemporânea e ao alcance de todos. A arte, como outra actividade qualquer, é para ser realizada e usufruida por todos. Por puro prazer!

Quando olhámos para a história da arte, vemos um desfile de nomes consagrados com as suas obras primas. Tal não deve ser inibidor da nossa expressão; antes inspirador de uma procura mais autêntica de nós. Tantas vezes somos castrados pelo passado...

Isto para dizer que adoro viver este tempo de "crise". Só agora é possível (ainda por cima, a uma mulher) abarcar tudo aquilo que me move num gesto ou momento.

TVV

PS. Gostei da sua comparação entre a performance e fotografia. Uma gera o momento, outra fixa-o. Complementares sem dúvida.