sábado, 12 de maio de 2007

ainda não há nada como a família





a nossa casa, as pessoas todas no seu lugar, os objectos até se sentem à vontade para falar uns com os outros. é um sossego, sobretudo à hora em que as empregadas já saíram e deixaram tudo limpo. há passos de avós, de bisavós e de trisavós nos quartos superiores, o que é securizante, trans-geracional. eu gosto muito de convidar os meus amigos para o lanche, pelo convívio, e depois temos aquele chá que um tio trouxe de fora e é impossível de encontrar na europa, com uns scones, não dispenso. polimento e simetria, cada pessoa na sua posição, e onde não estão pessoas estão móveis, e paredes, e claro-escuro, ou seja, não há falhas para dentro da moldura. tratamos de tudo devidamente. claro que as coisas mudaram um pouco, há sempre alguma mudança, mesmo nos relógios é preciso prestar atenção, têm tendência a parar. e às vezes um ou outro fotógrafo entra com o seu modelo, atraído pela fama da casa, que é de família e já aqui está há muito tempo, mas fica tudo muito bem, não temos razões de queixa, e sempre dá para algum restauro que vai sendo preciso. gosto especialmente dos dias em que há festas, em que uma especial animação volta aos móveis. adoro ver a forma galante com que os sofás convidam as cadeiras para dançar, o frenesim dos candelabros, o fluxo das emoções, os pequenos gritos contidos das adolescentes. é que os pólens entraram pelas janelas durante o dia, quando a casa estava a arejar, e elas beberam um copo de sangria às escondidas, o que agora lhe vai provocar reviravoltas na cabeça quando acabarem por ter de subir aos andares de cima, e passarem de pés descalços, junto aos quartos onde dormem as antepassadas, para não as acordar.

Foto: copyright Joris Van Daele - http://www.barenakedgallery.
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=Reprodução expressamente autorizada pelo autor=

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