Transferência "(...) A PSICANÁLISE INVENTOU DE FACTO UMA NOVA FORMA DE AMOR CHAMADA TRANSFERÊNCIA." JACQUES-ALAIN MILLER (Lacan Dot Com)
sábado, 22 de novembro de 2008
balões
Deixa o rio fluir.
Deus atou-nos
A este enigma
E partiu
Com um riso louco.
Ficámos sós
Com a corrente.
Sós
Com as lâmpadas acesas
Das estações desertas
Do Alto Douro.
Sem poder acudir ao gato
Agonizante.
Com os bancos à espera
Dos passageiros
Do passado,
E ouvindo
Esta batida dos tacões
Sobre o metal
Da linha;
Sentindo este cheiro
De alcatrão
Em que se dissolvem
Os comboios por vir;
Erguendo as mãos
Sobre a agonia;
Elevando os pés
Sobre os músculos
Da noite.
As luzes acenderam-se
E Deus lançou os dados,
Mas logo partiu
Com uma gargalhada
Dos diabos,
A esconder a sua capa vermelha
No escuro.
Ficámos sós
Com o corpo
Entre cadeiras,
Vendo os vestidos
A serem levados pela corrente,
E as corolas abrindo-se
E escoando-se
Rapidamente.
Mas tudo isso
Já o sabíamos
Há muito!
Por isso corro pela estação
Em demanda dos teus lábios;
Encontro-os deitados
No meu colo
E não sei bem
O que me pedem.
Acaricio-te o peito,
Essa suavidade,
Oh meu deus, como a acaricio
Lentamente,
Com todos os meus sentidos
Virados na direcção
Do rio;
E assisto ao crescendo
Da Respiração,
Ouço a corrente,
Vejo os pássaros cantarem
Em plena noite.
Olho-te implorando,
Vejo o gato pedindo,
E pergunto-me:
Meu Deus, e a mim,
O que me cabe agora
Fazer?!
Os balões explodem
No meu cérebro.
Os balões de luz.
Só tenho os teus lábios
Como orientação,
Antes que a corrente
Também a arraste,
E as imagens
Do desamparo
Se estiquem
E rompam
Algo de virginal
Que apesar de tudo
Existe neste Enigma!
Nas estações
Do Alto Douro
Mergulhadas
No seu negrume
Largo pois também
Os meus lábios
Aos fluidos
À atmosfera
Às flores
Dentro da noite,
Aos balões acesos
Que se acendem
Pouco a pouco
Oh meu deus, quão
lentamente,
Dentro de ti.
_____________________________
Foto: Bogdan Zwir
Fonte: http://www.zwir.ru/zwir.htm
Texto: voj porto novembro 2008
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2 comentários:
o que permaneçe enigma...desafia o porvir...
Chama em balão de um olhar
na penumbra...enxameia o apelo do gato...sem acudir á respiração que morre nos lábios do banco dentro da estação
Onde só passa a tua sombra e o meu passado...
Ao digº Vítor Oliveira Jorge pelos balões-luz que soltou no seu Poema e que aqui lhe devolvo em jeito de Comentário...Obrigada helenabranco
obrigado.
Vitor
até à próxima alumiação.
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