
A relação pedagógica é uma forma de relação humana. Como toda a relação humana, é embebida de simbólico e movida pelo desejo.
O desejo alimenta-se de fantasias, quer dizer, de determinadas "imaginações" que, mesmo que racionalmente saibamos que se não podem concretizar, ou que têm uma pequena probabilidade de se concretizar na realidade, precisam de ser mantidas em suspenso para que o sujeito respire, para que ele sinta que tem um ponto de fuga por onde escapar à monotonia e à banalidade do dia a dia.
O(a) aluno(a) pode projectar no seu (sua) professor(a) uma fantasia, e vice-versa, mais ou menos forte. Quer dizer, mais ou menos relacionada com expectativas inconscientes muito antigas, com vácuos a preencher de que o sujeito não tem, muitas vezes, consciência plena, se é que tem alguma.
O próprio efeito de ensinar e de estar aberto(a) ao ensinamento é de natureza fantasmática: espera-se sempre muito mais do que realmente acontece, ou então projecta-se no que acontece um "algo mais", uma "mais valia" que mostra bem já a fantasia a funcionar. Há a transposição de outras "faltas", ou "falhas", ou expectativas do sujeito, para a relação pedagógica.
O assunto é para psicólogos e psicanalistas, que eu não sou. Por isso, se disser algum disparate, corrijam-me por favor.
Por exemplo, um(a) aluno(a) pode ter uma "simpatia" especial por um(a) professor(a). Está perfeitamente consciente disso. Tenta agradar-lhe de forma mais ou menos subtil, para não parecer "graxa", sobretudo para não ser entendido como procedendo com um fim meramente utilitário.
A classificação final, se não corresponder às suas expectativas, pode interferir com a sua fantasia. Afinal o(a) professor(a) só tinha uma maneira viável, legal, não comprometida de o recompensar, isto é, de mostrar que o seu interesse era correspondido.
E essa maneira era de lhe dar uma boa classificação, mesmo que objectivamente o aluno não a merecesse tanto assim.
Mais: o(a) aluno(a) já pode ter feito um exame um tanto mais descontraído, num misto de testar o(a) professor(a) (a capacidade deste(a) de jogar com o único poder que tem) e de sentir que a nota, a boa nota, já "estava no papo", porque o(a) professor(a) estava de tal modo encantado(a) com ele(a), aluno(a), que não escaparia também ao desejo de lhe dar esse sinal...
A coisa é, ou pode ser, muito mais complexa do que isto, claro. Tanto um(a) aluno(a) como um(a) professor(a) sabem isso.
Aliás, a repetida expressão de tratamento como "professor" ou "professora" pode inserir na relação uma mais-valia que é do domínio erótico.
Pois não é o erótico um encontro, uma lide, em que se jogam poderes subtis, e onde o que se diz, e como se diz, produzem efeitos, mesmo antes do que se faz? De forma que a relação pedagógica é carregada de erotismo. Veja-se por exemplo a peça "A Lição" de Ionesco...
Por isso esta relação é, como medida de precaução, normativizada e eventualmente criminalizada pela sociedade, que sabe bem como se pode dar a fácil passagem "de uma situação para outra", a todo o momento, dentro de uma sala de aula, que é também uma câmara de segredos, mesmo quando há muita gente e a luz a inunda.
Os olhares, as expressões, os ênfases, as posturas corporais, todo um jogo imenso de "imagens-nuas", que aliás estão sempre a ocorrer no dia a dia, ali perpassam.
Mas, na sala de aula, há um ambiente fechado, de "transferência", de divã, ou de face a face, que é eminentemente tensional, mesmo quando afecta um aspecto extremamente "sportiv".
Ainda bem: a sociedade também sabe que não pode higiniezar tudo e todos, transformando-nos em máquinas, em autómatos, em sistemas de funcionalidades. A perversão coabita connosco, e só se agudiza se a quisermos negar. Se não houver uma forma ou outra de "empatia" não há aprendizagem...
Essas "forças" podem então aparecer sob formas de violentação do outro, que são variadíssimas, e que não são apenas do suposto pólo do poder (docente) para o suposto pólo da submissão (discente), mas ocorrem em muitos sentidos.
Um(a) jovem sabe o poder que tem com um simples gesto ou expressão que já percebeu ter "influência" no professor(a). Ninguém é inocente. Por isso a sociedade tem de estabelecer regras de convivência, um quadro legal em que tudo isto possa decorrer sem sobressaltos e, portanto, delimitar o melhor possível o domínio do normal do domínio da infracção, sabendo que muitas vezes todos estamos algures, nalgum momento da nossa vida, entre os dois. No campo do risco, no plano da fantasia, sem a qual a vida seria sufocante.
As fantasias são do domínio do não dito, do entredito ou interdito... e qualquer um de nós sabe que é sobre esse "fundo" sem fundo que assenta a relação humana e, em última análise, o "laço social", o facto de todos os dias, pela própria continuidade da nossa acção, fabricarmos e refabricarmos a vida em comum, com toda a ambiguidade e tensão que ela comporta. A micro-física do poder - de que falava Foucault - tem também a ver com isto, claro.
O desejo alimenta-se de fantasias, quer dizer, de determinadas "imaginações" que, mesmo que racionalmente saibamos que se não podem concretizar, ou que têm uma pequena probabilidade de se concretizar na realidade, precisam de ser mantidas em suspenso para que o sujeito respire, para que ele sinta que tem um ponto de fuga por onde escapar à monotonia e à banalidade do dia a dia.
O(a) aluno(a) pode projectar no seu (sua) professor(a) uma fantasia, e vice-versa, mais ou menos forte. Quer dizer, mais ou menos relacionada com expectativas inconscientes muito antigas, com vácuos a preencher de que o sujeito não tem, muitas vezes, consciência plena, se é que tem alguma.
O próprio efeito de ensinar e de estar aberto(a) ao ensinamento é de natureza fantasmática: espera-se sempre muito mais do que realmente acontece, ou então projecta-se no que acontece um "algo mais", uma "mais valia" que mostra bem já a fantasia a funcionar. Há a transposição de outras "faltas", ou "falhas", ou expectativas do sujeito, para a relação pedagógica.
O assunto é para psicólogos e psicanalistas, que eu não sou. Por isso, se disser algum disparate, corrijam-me por favor.
Por exemplo, um(a) aluno(a) pode ter uma "simpatia" especial por um(a) professor(a). Está perfeitamente consciente disso. Tenta agradar-lhe de forma mais ou menos subtil, para não parecer "graxa", sobretudo para não ser entendido como procedendo com um fim meramente utilitário.
A classificação final, se não corresponder às suas expectativas, pode interferir com a sua fantasia. Afinal o(a) professor(a) só tinha uma maneira viável, legal, não comprometida de o recompensar, isto é, de mostrar que o seu interesse era correspondido.
E essa maneira era de lhe dar uma boa classificação, mesmo que objectivamente o aluno não a merecesse tanto assim.
Mais: o(a) aluno(a) já pode ter feito um exame um tanto mais descontraído, num misto de testar o(a) professor(a) (a capacidade deste(a) de jogar com o único poder que tem) e de sentir que a nota, a boa nota, já "estava no papo", porque o(a) professor(a) estava de tal modo encantado(a) com ele(a), aluno(a), que não escaparia também ao desejo de lhe dar esse sinal...
A coisa é, ou pode ser, muito mais complexa do que isto, claro. Tanto um(a) aluno(a) como um(a) professor(a) sabem isso.
Aliás, a repetida expressão de tratamento como "professor" ou "professora" pode inserir na relação uma mais-valia que é do domínio erótico.
Pois não é o erótico um encontro, uma lide, em que se jogam poderes subtis, e onde o que se diz, e como se diz, produzem efeitos, mesmo antes do que se faz? De forma que a relação pedagógica é carregada de erotismo. Veja-se por exemplo a peça "A Lição" de Ionesco...
Por isso esta relação é, como medida de precaução, normativizada e eventualmente criminalizada pela sociedade, que sabe bem como se pode dar a fácil passagem "de uma situação para outra", a todo o momento, dentro de uma sala de aula, que é também uma câmara de segredos, mesmo quando há muita gente e a luz a inunda.
Os olhares, as expressões, os ênfases, as posturas corporais, todo um jogo imenso de "imagens-nuas", que aliás estão sempre a ocorrer no dia a dia, ali perpassam.
Mas, na sala de aula, há um ambiente fechado, de "transferência", de divã, ou de face a face, que é eminentemente tensional, mesmo quando afecta um aspecto extremamente "sportiv".
Ainda bem: a sociedade também sabe que não pode higiniezar tudo e todos, transformando-nos em máquinas, em autómatos, em sistemas de funcionalidades. A perversão coabita connosco, e só se agudiza se a quisermos negar. Se não houver uma forma ou outra de "empatia" não há aprendizagem...
Essas "forças" podem então aparecer sob formas de violentação do outro, que são variadíssimas, e que não são apenas do suposto pólo do poder (docente) para o suposto pólo da submissão (discente), mas ocorrem em muitos sentidos.
Um(a) jovem sabe o poder que tem com um simples gesto ou expressão que já percebeu ter "influência" no professor(a). Ninguém é inocente. Por isso a sociedade tem de estabelecer regras de convivência, um quadro legal em que tudo isto possa decorrer sem sobressaltos e, portanto, delimitar o melhor possível o domínio do normal do domínio da infracção, sabendo que muitas vezes todos estamos algures, nalgum momento da nossa vida, entre os dois. No campo do risco, no plano da fantasia, sem a qual a vida seria sufocante.
As fantasias são do domínio do não dito, do entredito ou interdito... e qualquer um de nós sabe que é sobre esse "fundo" sem fundo que assenta a relação humana e, em última análise, o "laço social", o facto de todos os dias, pela própria continuidade da nossa acção, fabricarmos e refabricarmos a vida em comum, com toda a ambiguidade e tensão que ela comporta. A micro-física do poder - de que falava Foucault - tem também a ver com isto, claro.
5 comentários:
Ainda bem que a relação professor aluno não se limita ao que disse, Há muitas outras vias que não foram expostas. Apenas expõe aquela que lhe interessa. Enfim....
Por que não expõe você a sua versão?... Era mais enriquecedor e dialogante... este texto é apenas um apontamento circuntancial e muito redutor... mas é talvez melhor que nada. Pois claro que sobre as relações professor-aluno há bibliotecas inteiras...
Mas é a "fé" numa imanente reciprocidade que alimenta o pictórico homem tontinho face a uma mulher.
Uma aluna das tais (não interessa qual)
"Mas é a "fé" numa imanente reciprocidade que alimenta o pictórico homem tontinho face a uma mulher."
Que significa isto?...
Significa exactamente o que se assentou, escrito.
Ok, levantando o véu por outra ponta: é uma questão de "fé", isso de que se alimenta um Desejo.
Boa Noite!
A aluna das tais (faria grande diferença saber qual?)
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