sábado, 30 de junho de 2007

foto d' época balnear


ao fundo, no mar negro,
passam banhistas muito brancas,

deslizando à tona, abandonando-se
à liberdade das correntes, como veleiros

que não levam ninguém.


aqui podem seguir-se
pegadas
na areia, onde ainda
aparecem em negativo
as nossas
brincadeiras antigas,


quando toda a realidade passava pela pele,
por esse movimento total
para fora,
em que o corpo
deixava de existir,
trespassado
pelo vento.

o tempo entretanto repuxou
os tons de claro e escuro

e acumulou dunas entre as coisas;

e sobre essas dunas concrecionadas

instalaram-se tapetes de ervas,

plantas que suportam bem o sal.



e nós?
parece que ficámos literalmente
em lado nenhum,
deitados,
erguendo por vezes
uma perna no verso
para que este ainda se alteie,
e tente ver o mar, o seu negrume antigo,

boiando pouco a pouco no revelador;

e, se tudo correr bem,
sobre ele, o céu,
ainda mais negro.

mas de aparências, não de certezas, está feita
esta época balnear,
em que até as riscas dos toldos
se desbotam na sua sombra
projectada na areia.

por isso os versos voltam como o vento
ou o apito longínquo de um banheiro:
sempre procurando entre a onda
e o que ela acaba de inundar,

uma antiga, adolescente,
saudade de ir à praia.



voj 2007
Foto: Jotis Van Daele (reprod. aut.)
Fonte: http://www.barenakedgallery.com/home.htm

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