por que é que a nudez das coisas é tão atraente que, se estiver lado a lado a mesma coisa, mas de um lado nua, e de outro lado vestida, a nossa curiosidade se volta de imediato para a que não está ataviada
- mesmo que aquela, que o está, o tenha feito com extremo requinte?
as mulheres sabem isto perfeitamente, e por tal razão é que desde o início dos milénios se engalanam de toda a maneira, como que a quererem manter o segredo. e o segredo é este:
a nudez desdobra-se, espelha-se, reflecte-se, tem qualquer coisa que se não contém em si mesma, que possui a tendência para a dobra, para a réplica, para a reprodução.
por isso a sua aura não morreu com a respectiva replicação (erro, como sabemos, muito propalado), bem ao contrário: só aumentou, como qualquer um sabe.
pois por muito belo que seja um ser nu, sozinho numa paisagem, ele nunca está de facto só, mas dele saem em todas as direcções reproduções de si mesmo, que o tornam no centro, sempre desdobrado, de um campo de tensões.
a nudez é o núcleo de um feixe de raios e de forças sempre imprevisível, porque constituído por geometrias complexas, das quais apenas uma pequeníssima percentagem é da ordem do visível e do calculável. a nudez tem qualquer coisa de divino.
e por isso é que todos os que se entregaram ao sacrifício, para eventualmente atingirem o paraíso ou outro objectivo qualquer, tiveram de se despir primeiro. veja-se o caso paradigmático e extremo de cristo, filho do pai: agarrado ao madeiro da cruz pelo seu próprio êxtase hemorrágico, erguia constantemente os olhos e os braços para fora de si, multiplicando-se nas imagens dos crucificados ao lado, e depois ao longo da história através de milhões e milhões de réplicas, que o instauraram, de facto, no real acontecido, como um verdadeiro deus.
por isso o olhar não consegue descentrar-se da imagem nua; ela obceca, espelha, e a determinada altura o observador está de facto a ser olhado pela figura, que o fixa longa e eficazmente, hipnotizando-o a partir de um campo de forças, envolvendo-o completamente na sua paixão.
o que tem algo de enigmático e de pérfido, e que aliás está presente em todos os ícones: é que, começando por serem o símbolo da paz e da aquietação, acabam por instaurar, pela sua simples presença, um ambiente de inquietude, uma atmosfera que não é normal, e que com o tempo nos banha de uma luz que não se torna facilmente respirável.
voj 2007
Foto: Raymond en Saskia
(rep. aut.)
Fonte: http://raym.deds.nl/indexeng.html
- mesmo que aquela, que o está, o tenha feito com extremo requinte?
as mulheres sabem isto perfeitamente, e por tal razão é que desde o início dos milénios se engalanam de toda a maneira, como que a quererem manter o segredo. e o segredo é este:
a nudez desdobra-se, espelha-se, reflecte-se, tem qualquer coisa que se não contém em si mesma, que possui a tendência para a dobra, para a réplica, para a reprodução.
por isso a sua aura não morreu com a respectiva replicação (erro, como sabemos, muito propalado), bem ao contrário: só aumentou, como qualquer um sabe.
pois por muito belo que seja um ser nu, sozinho numa paisagem, ele nunca está de facto só, mas dele saem em todas as direcções reproduções de si mesmo, que o tornam no centro, sempre desdobrado, de um campo de tensões.
a nudez é o núcleo de um feixe de raios e de forças sempre imprevisível, porque constituído por geometrias complexas, das quais apenas uma pequeníssima percentagem é da ordem do visível e do calculável. a nudez tem qualquer coisa de divino.
e por isso é que todos os que se entregaram ao sacrifício, para eventualmente atingirem o paraíso ou outro objectivo qualquer, tiveram de se despir primeiro. veja-se o caso paradigmático e extremo de cristo, filho do pai: agarrado ao madeiro da cruz pelo seu próprio êxtase hemorrágico, erguia constantemente os olhos e os braços para fora de si, multiplicando-se nas imagens dos crucificados ao lado, e depois ao longo da história através de milhões e milhões de réplicas, que o instauraram, de facto, no real acontecido, como um verdadeiro deus.
por isso o olhar não consegue descentrar-se da imagem nua; ela obceca, espelha, e a determinada altura o observador está de facto a ser olhado pela figura, que o fixa longa e eficazmente, hipnotizando-o a partir de um campo de forças, envolvendo-o completamente na sua paixão.
o que tem algo de enigmático e de pérfido, e que aliás está presente em todos os ícones: é que, começando por serem o símbolo da paz e da aquietação, acabam por instaurar, pela sua simples presença, um ambiente de inquietude, uma atmosfera que não é normal, e que com o tempo nos banha de uma luz que não se torna facilmente respirável.
voj 2007
Foto: Raymond en Saskia
(rep. aut.)
Fonte: http://raym.deds.nl/indexeng.html
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