segunda-feira, 25 de junho de 2007

limiar


as praias, não as que as multidões invadem
no verão,
mas as que o vento, as falésias, as algas geram,
são capazes de metamorfosear as pessoas:

nunca se vem dali igual
depois de ter visto o limite deste mundo
junto das ondas que naufragam desde
o começo de um outro, originário;

e há uma nudez nesse regresso,
uma absoluta estupefacção,
um excesso, um grito que as pessoas trazem,
como a areia entranhada nos dedos.

são estas figuras alteradas que o poema acolhe,
a quem chega uma tina de água doce
onde mergulharem os pés,

e uma toalha onde se embrulharem
para caminhar enfim firmes pela casa.

só estas presenças transmutadas
pelas ondas e pelo iodo das paredes
me interessam:

trazem uma âncora, uma urgência,
o esbracejar de um polvo vivo,
uma onda que atravessa o corredor e,
no seu corpo, transporta
a própria essência da juventude,
a promessa expressiva, audaz,
de um começo qualquer;

um movimento para a frente
que rasga o hímen da folha
e força o poema a penetrar
noutro poema que se segue.

voj 2007



Foto: Pascal Renoux (reprod. aut.)
Fonte: http://www.pascalrenoux.com/Nudes.html

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