A reprodução interdita
No museu de Roterdão – Boymans-van Beuningen Museum – existe um óleo sobre tela, com as dimensões de 79 por 65,5 centímetros, que se intitula: “A Reprodução Interdita (Retrato de Edward James)”, e que foi pintado por René Magritte em 1937.
Trata-se de uma figura de tipo masculino virada para um espelho, no qual todos os objectos estão reflectidos como habitualmente, menos a dita figura.
Este quadro faz parte de uma série de “retratos” que aquele banqueiro inglês e coleccionador de arte encomendou ao autor, que foi seu hóspede durante vários meses.
O que esta pintura “representa” é a absoluta incapacidade (impossibilidade) da reprodução, de representação, do outro. O outro é para ele mesmo um enigma, tal como para mim que o vejo. O outro é uma pose enigmática: por isso tanto me dá que me volte o rosto ou não, tanto lhe dá que se veja a si no espelho como não. A sua pose é mais importante que o suposto ele que ele é (ou julga ser). Mas o banqueiro pagou: e nesse sentido aceitou a obra, tornou-se cúmplice do pintor. Quer dizer, sabia ser uma pose, uma sucessão de poses (porque há várias versões destes “retratos”). Ao olhar-se voltada para o espelho, a figura vê aquilo que o pintor vê: observa-se de costas. Mas o pintor vê mais: vê-o a ele reflectido como a imagem que o pintor vê. E o pintor dá-nos a ver isso, o que nos permite ver mais que ambos, naquele momento que o quadro supostamente fixa.
O mistério permanece: e se um dia o retratado se voltar, cento e oitenta graus, e encarar de rosto o retratista? Verá finalmente este a face de Edward James olhando-o do espelho, no retrato?
Está aqui (na obra e nas perguntas que suscita, nos definitivos abismos – ou se quisermos, nas pequenas fissuras - que abre) toda a arte, toda a ciência, toda a cultura do Ocidente. Todo o nosso abandono. Todo o nosso génio.
6 comentários:
Sem dúvida.Aqui está o grande mistério inerente à condição humana:o conhecer o "outro";saber,realmente quais os verdadeiros mecanismos que formam a personalidade alheia,nos seus actos,pulsões e instintos.
Ao mesmo tempo,o Homem não consegue,muitas vezes,conhecer-se a fundo,determinar quais os verdadeiros traços da sua Psique,pois as camadas da Consciência humana são como um mar revolto:são enganadoras e de forma incerta.Gosto muito do quadro do Magritte.É muito eloquente neste sentido.
Deixo-lhe aqui duas sugestões:uma de pintura e outra de poesia,isto,claro está,se já não conhecer.Ferdinand Hodler,pintor suíço,considerado um dos grandes nomes do Simbolismo.Vittoria Colonna,poetisa italiana do século XVI,que escreveu sonetos de grande beleza.Tem aqui o endereço do site:http://www.jimandellen.org/vcpoetry/vctitle.htm
Os textos estão traduzidos para Inglês,mas só os consegui obter assim.Espero que goste.
Quais são os seus pintores preferidos?
É uma pergunta complicada,porque gosto de muita coisa,dentro de várias épocas e estilos,mas...aí vai:Berthe Morissot;Kokoschka;Klimt;Brueghel;Matisse;Pollock;Kandinsky;Soutine;Vieira da Silva;Picasso;Van der Goes(adoro os Flamengos);Renoir;Goya;Monet;Degas;Almada;Souza-Cardoso;Dali;Tanguy;Hobbema(pela vertente Natureza,simples);Mondrian;O´Keefe;Leonardo;Rafael;Giotto;Fra Angelico(pela generosidade da sua fé);Magritte;Hodler;Galen-Kallela;David;El Greco,e outros ainda.Gosto de vários géneros.
Muito interessante!
Bom final de semana!
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