quarta-feira, 7 de novembro de 2007

qualquer coisa de excesssivo



desconheces os olhos da madrugada

pisados pelos suores do dia;

os odores das tábuas.
onde uma série de manhãs procuram
emergir através das frinchas;

esta fantástica quantidade de notas
que caminham para aqui,

como se fossem um exército
de ritmos loucos, em catadupa;

um vento de flores
vindas do pântano do passado,
voando;

os pés que circulam
pela sua nudez,
sobre a tua memória.


sim, desconheces o luto
dos países jamais visitados,
e de onde não chegam
sequer os odores da saudade;

o cheiro do corpo
abandonado no pijama,
o passo desamparado
em direcção à cama;

o membro vigoroso
que conduz o candeeiro;

o umbigo onde ainda treme
outro umbigo mais interior;

a noite. esta noite que fica algures
no meio da noite, e onde
as figuras olham em silêncio,
sem qualquer opinião,
a eternidade dos frescos
subterrâneos;


este corpo, este cabelo,
este vestígio de algo de importante
que se terá passado.

este mel que escorre
em ondas
gordas
de dentro dos boiões do tempo

para dentro dos teus poros

esta ausência maravilhosa
de deus, sorrindo placidamente
com o seu rosto amarelo.

este portentoso músculo de felino
este elástico,
este caule
esta pedra fálica que está na clareira.

desconheces
como se escreve aqui
um corpo desaparecendo

entre bambus.
assassinado pelos
tambores.

estás do outro lado
desta força, deste candelabro
que se ergue,

incapaz de compreenderes
o rosto magnífico
que te olha, que te não larga
jamais um segundo de dia ou de noite

música, musa, muda deusa
a quem incessantemente toco
no desejo insano

de te retirar da parede.

como aquele que aparece do nada
e apõe o manto de incenso
ao elefante ajoelhado

e desdobra com dedos finos
o tecido até à sua
última consequência.

até à prega em que se esconde
a gota do amor consumado,

a cera vertida há séculos

que ainda arde

uma luz excessiva

que sobrou no meio da noite
e veio instalar-se sob o texto

para o derreter no leito lento
do amor

através dos séculos


voj 2007



Foto: Darren Holmes
Fonte: http://www.darrenholmes.com/





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