OS PRISIONEIROS DAS CASAS
Jamais conseguiremos resolver o mistério de saber se somos nós que habitamos as casas ou se são as casas que nos habitam. Devagar, as casas tomam conta de nós e assistem à lentidão dos gestos. Algures, alguém segura uma chávena. No momento em que falo, em que as minhas palavras se oferecem já ao esquecimento, há uma rapariga que veste um vestido colorido para a noite de estio. Há um espelho desejando a música que perpassa em seus ombros e uma solidão de séculos mordendo a melancolia. Um rapaz sonha a rapariga. Um outro rapaz sonha ser a rapariga. E a casa sonha-os, como personagens que ardem. Portas abrem-se e fecham-se com estrondo. Janelas convidam suicidas. Janelas convidam janelas. Janelas espreitam a tarde escorrendo pelas paredes, a procura vã da velha mulher, a loucura toda de um fim de dia.
Por entre os lábios, juntamos palavras à matéria das casas. Mas as casas persistem em seu silêncio e sobrevivem-nos nesse silêncio. As casas imaginam-nos como gostaríamos de ter sido e a nossa vida é uma sucessão de casas que o tempo vai escurecendo. O corredor oblíquo da infância, o arco desmedido da entrada, o desespero das mãos, a vastidão da mesa, a crua simplicidade da velha arca.
Quem é capaz de conter a implosão das casas em nós? Quem segura nosso peito? Quem colhe um a um os pedaços? Quem, entre ruínas, nos fala ainda?
E dentro da casa todas as coisas. De um tempo imemorial, as coisas. Minuciosas, como um ritual, as coisas. Mnemónica de sempre, as coisas. Elegia permanente, as coisas. Ode permanente, as coisas.
O homem das sete partidas regressa cansado à casa e chora. As sete partidas só existem a partir da casa. E somos todos - todos! - prisioneiros das casas.
João Teixeira LopesPor entre os lábios, juntamos palavras à matéria das casas. Mas as casas persistem em seu silêncio e sobrevivem-nos nesse silêncio. As casas imaginam-nos como gostaríamos de ter sido e a nossa vida é uma sucessão de casas que o tempo vai escurecendo. O corredor oblíquo da infância, o arco desmedido da entrada, o desespero das mãos, a vastidão da mesa, a crua simplicidade da velha arca.
Quem é capaz de conter a implosão das casas em nós? Quem segura nosso peito? Quem colhe um a um os pedaços? Quem, entre ruínas, nos fala ainda?
E dentro da casa todas as coisas. De um tempo imemorial, as coisas. Minuciosas, como um ritual, as coisas. Mnemónica de sempre, as coisas. Elegia permanente, as coisas. Ode permanente, as coisas.
O homem das sete partidas regressa cansado à casa e chora. As sete partidas só existem a partir da casa. E somos todos - todos! - prisioneiros das casas.
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FOTO: Matt Haber (rep. aut.)
Fonte: http://www.matthaber.com/
2 comentários:
O meu amigo e sociólogo bem conhecido João Teixeira Lopes colega também da FLUP, decidiu enviar este texto como prenda de Natal. Assim, algo de novo acontece. Assim, sim!
Um grande abraço solidário e grato.
Resta-me acrescentar, o aque me esqueci de fazer, que a escolha da fotografia é de minha responsabilidade.
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