domingo, 30 de dezembro de 2007

Gosto muito deste autor, ou a atracção do barroco (e da sua ambiguidade...)

Este livro, que anda em torno de Nietzche, foi publicado pela Vega, e é de 1993.
Não sei se esta colecção ("Passagens"), dirigida por outro excelente autor (José Bragança de Miranda) ainda continua, mas está à venda (por exemplo, numa das melhores livrarias do país - pelo menos para assuntos de arte e de filosofia da arte, a de Serralves - livros da Verso e da Zone Books vêem-se lá com frequência, por exemplo...).
O último capítulo interessou-me muito: intitula-se "Formas do barroco na filosofia contemporânea". Sempre intui que a revalorização do barroco tinha muito a ver com os tempos de hoje. Como? Depois de ler este capítulo (que sigo nas notas seguintes) entendo melhor.
Características do barroco (Marques inspira-se aqui em Benjamin) que também se notam na pós-modernidade:
- Perda da teleologia, ou seja, de "uma causalidade final que oriente a acção em geral" (op. cit., p. 128)
- imanência rigorosa, ou seja, "(...) descentramento e a irradiação de acções, não a partir de um centro, fora de cada um dos sujeitos agentes mas, ao contrário, a partir de cada um deles." (ib, p. 129). A lógica barroca é "claramente anti-emanentista": não há "uma origem, mas origens imaginadas: caja sujeito, ele próprio suposto ser fonte de acção" (p. 129).
- desaparecimento da diferença entre aparência e ser (p. 128), que "só tem sentido numa lógica da transcendência, em que para lá do aqui visível e compreensível houvesse uma razão que a justificasse." (p. 130).
- fraccionamento e proliferação de signos em geral (p. 128), ligados à proliferação das "supostas origens", "dos pontos de vista", das "representações" (p.130).
E acrescenta o autor (p. 131):
" A perda de transcendência e de sensibilidade escatológica, a multiplicação das perspectivas, ligada à fragmentação do tecido tecnológico, parecem ser na realidade limites, mas também pontos de partida, para a errância cultural e a auto-reflexão do homem contemporâneo."
Refere depois Nietzsche e o seu "panperspectivismo" (ib.)...
Mas também o "carácter complexo e antitético que o próprio Barroco essencialmente é" (ib.), ao paradoxalmente se ligar ao que o autor designa (lembrando a componente mística e teológica da "alma barroca" - ib.):
- a nostalgia da origem, sempre presente segundo Benjamin no drama barroco (ib.)
- a vertigem, a visão mística da totalidade e da mimesis universal, contada no modo da alegoria, da "proliferação semiótica sem fim" ((p. 133) (diferente da "obtida no drama, a partir do puro jogo e da ilusão mais pura que o ser" - pp. 132 e 133).
Em autores como Heidegger ou Benjamin encontram-se, para Marques (p. 133), essas categorias da "emanação", da "mimesis" universal e da "origem", "categorias de uma tradição que prefere o registo esotérico ao registo crítico, imanentista e possivelmente dissolvente" de Nietzsche. As ambiguidades do barroco ("imanência e proliferação dos signos", "desdobramento de perspectivas", mas também "nostalgia da origem" e "vertigem da totalidade", estão presentes em Leibniz (p. 134), sobre o qual, como é sabido, Deleuze escreveu.
Para Marques (ib.) - e peço desculpa destas contínuas citações, mas este pequeno e incisivo texto foi para mim muito importante - muitas filosofias, hoje, que se excluem mutuamente, que são antagónicas, reúnem-se, porém, na "forma alegórica" e no "fascínio pelo jogo dos signos".
Um autor, um livro, e um texto que recomendo vivamente!


1 comentário:

tiago disse...

gstei mt do post. esta muito bom e fez bem em partilhar. gostaria de falar consigo pois estou a fazer um trabalho academico sobre o barroco enquanto forma aberta de arte!... add! black_lizard_08@hotmail.com
abraços