segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

sequência pastoril












1

esse teu movimento
de camponesa despida

trazendo-me os lábios e os seios
a sua cor vermelha
como se fosse
uma colheita de maçãs
luzidias

esse à-vontade
com que te aproximas nua,
com o sol ruivo
a desdobrar-se em fios, em
pequenos novelos,
como uma decoração
entre as pernas

esse teu ar atrevido
de quem vai proceder
à coisa mais natural deste mundo
















2

apresentas-te como
um ninfa, uma estátua serena,
com um pé nu à frente

e toda tu atrás, resoluta e
natural como uma miúda
iniciando um jogo

e sorris abertamente
como uma estação
que se abre, fulva,

como se o que se vai passar
fizesse parte dos prados
e laranjeiras, e hortos

caminhas para mim
e sideras-me totalmente

esse modo de cruzares os braços
para erguer a blusa
essa forma de te destapares sorrindo














3


lanças-me a língua
ao sexo
como se fosse a primeira vez


e uma romã, ou framboesa
fosse o sabor
por que o teu palato aspira

com curiosidade


lanças-me esse olhar
de confirmação

enquanto me contorço
e da janela entrevejo
o estalido das romãs
a abrir















4


ofereces-te agora
de costas
com os cabelos descendo
quase até às nádegas


agarro aí o sol do poente
os silvos dos pássaros

e cheiro pela primeira vez
todo o teu corpo,

a pele, os seus
pequenos pêlos fulvos

sinto
a modulação das colinas
o modo como a boca
desce para os vales

a água

o estremecer
de músculos









5

dobro-te toda

os calcanhares rosados
pequenos sinais nas ancas

os joelhos contra os seios

aperto-te
quase te desfaço

com se te quisesse reduzir
a um passarinho
que pudesse engolir

mas tu logo
com um gemido
te desdobras de novo

e pairas sobre mim,
dominas-me o ventre
trincas-me de novo

e um pardal foge da janela













6


e nestas coisas andamos
enquanto pelo quadrado
da porta

as luas e os sóis se sucedem

como se a nudez
nos imunizasse do tempo
e dos intrusos


e os próprios relógios
nos olhassem com o respeito
de não interromper


ao longe, sobre
um dos braços do maple
o teu soutien

e sobre outro a camisa
interior

ganham eternidade










7

é inevitável
o odor das ovelhas
e o do leite

que escorre


a paragem dos copos
as gargalhadas

a minha cabeça passando tardes
sobre o teu rabo

ouvindo-te
o fluxo do sangue
as pulsações

e os movimentos súbitos
que mudam
e trazem de novo os lábios

uma fulva humidade

uma paz imensa











8

viro-te sobre a cama
como se fosse ordenhar-te

penetro-te por detrás, fundo,
num súbito arremedo

e os lençóis ondulam
em luzes e sombras

como a superfície da areia
quando a água recua

viras a cabeça
para me interpretares

e vês as narinas dilatadas

a captar os odores todos
de dentro e de fora

o teu balido como ovelha













9


cavalgas-me
e em torno dos mamilos
giram as pequenas

framboesas

macias

enquanto a expressão
se te altera

está um cavalo a espreitar
de olhos muito abertos
silencioso

os êmbolos trabalham
com a lentidão e segurança
dos moinhos de água

as tuas duas nádegas
abrem-se ao cavalo
às mãos transtornadas












10



qualquer coisa abre
irrompe

é a fonte que dá
de beber aos caules

é a seiva a transcorrer
nos vasos verdes,
transparentes

são os olhos das ovelhas
muito abertos

é a lã, o seu odor,
os pássaros a subirem-me
pelo sexo

é o quarto todo
que circula em torno

são os sulcos rasgados
por onde escorre, serena,

a conclusão





Vítor Oliveira Jorge
25.1.10

1 comentário:

Paula Raposo disse...

Que maravilha de sequência!! Adorei...beijos.