sábado, 14 de junho de 2008

beleza do mundo

já pela segunda vez em poucos dias vejo pessoas postadas com uma máquina entre as grades do cemitério do Lordelo, aqui perto, a fotografar aquela paisagem funerária. Naturalmente que não ignoro a atracção de tais locais, nem o facto de serem destinos de visita desde sempre. O turismo é insaciável na invenção de novas coisas para ver e registar; a fotografia também, e hoje com o digital todos somos fotógrafos e, às vezes, mesmo grandes fotógrafos (tudo uma questão de produção).
Mas não pude deixar de pensar: morrem as pessoas e nem assim deixam os seus restos sossegados. Ou então: temos muito mais importância depois de mortos do que vivos, depois de anónimos até podemos ser o soldado desconhecido, com vigilante perpétuo, fardado a rigor. Ou ainda: que jogo de espelhos, com que fixação olhamos a morte (os seus signos) na vontade de a esconjurar, de antecipar o seu olhar imprevisível, a sua surpresa.
Mais adiante vi um tipo que parecia estar a fotografar um vulgar outdoor. Mas eu ia a conduzir, e ele podia estar a fotografar a parede próxima, ou mesmo os contentores do lixo anexos. Uma foto transfigura a realidade, torna-se arte. E a arte há muito que cobriu a realidade toda, é design. Uma menina morta e abandonada numa estrada, algures no começo da sua existência abortada, é um ícone eterno. Bendita seja a tecnologia, paz nos arquivos. Beleza do mundo quando o sol brilha nos pináculos dos jazigos.




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