Uma das maiores contradições da sociedade em que vivemos: por um lado, há uma exigência de concentração da atenção, dada a complexidade dos sistemas e a imposição de responder em curto prazo (os horários para tudo são uma das maiores formas de arregimentação dos indivíduos, de castração dos sujeitos, que se poderia imaginar); por outro lado, sempre que uma pessoa procura concentrar-se em algo, é interrompida logo por uma urgência. O ser fica desterritorializado dentro de uma paisagem de absoluto nonsense, muito pior do que o turista incauto perdido no deserto: é que o real é mesmo o deserto (como escreve Zizek no título de um dos seus livros). Há uma perturbação total da ordem simbólica, uma proletarização de cada indivíduo. Como diz Stiegler, a proletarização não é já só dos trabalhadores, é geral, é de todos nós como consumidores, consumidos por tanta regra, por tanta concentração e distracção, por tanta contradição, por tanta consumação de uma realidade de nós mesmos que nos foi criada por um sistema sem centro e sem responsáveis directos. Estamos sós e sem ninguém a quem recorrer. Como cães velhos entre flores, lindíssimo título do livro do Abelaira.
As pessoas estão a tornar-se um bem escasso, as que de facto têm capacidade de algum modo se centrarem e de assim terem disponibilidade para os outros. Há um enlouquecimento geral, e este não é, não pode admitir-se que seja, uma fatalidade.
Mas é difícil encontrar o way out. Implica concentrar a atenção nas formas de diagnosticar a complexa teia de causas desta loucura, impulsionada pelas tecnologias de aceleração.
Bem, vou a Serralves refrescar um pouco...
2 comentários:
A chave do sucesso está em centrarmos em nós próprios os nossos mais intensos pensamentos e reavaliarmos a todo o momento o que somos, o que pensamos e como agimos. Só assim saberemos com o que contamos e estaremos dispostos a ouvir os outros mesmo quando eles não tem a disponibilidade para o fazer.
Está preocupada com o sucesso, Vaca Louca? E está muito lúcida!
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