aqueles que viviam agarrados ao chão, a produzir alguma coisa que comer e que beber com as suas mãos, tinham facilmente a sensação de estarem vivos e de serem úteis, quer dizer, de terem um sentido para as suas vidas, criando-lhes as condições de prosseguimento (as chamadas perversamente "necessidades básicas");
aqueles que vivem agarrados à máquinas, delegaram já de uma forma decisiva a sensação (ilusão, se se quiser) de serem decisivos, além de que as suas mãos tanto podem ser instrumentos de potenciação (premirem o botão certo, manipularem o instrumento de forma hábil) como de desastre (um falhanço e lá se pode ir uma mão ou um trabalho inteiro ao ar). Mas sobretudo estão alienados, como Marx mostrou, separados da totalidade da cadeia de produção: não comem aquilo que produzem, produzem partes de coisas para um sistema abstracto. Tornaram-se abstractos também, estão nus. Quer como produtores, quer como consumidores. Aliás, são (somos) mais consumidores do que produtores, dado o carácter altamente desmaterializado, pós-industrial, dos mecanismos que accionamos. Uma das nossas maiores pragas foram os sistemas informáticos actuais, de que somos fiéis servidores. Sem dúvida que a tecnologia nos proporciona muitas oportunidades... estamos é a pagá-las bastante caro (refiro-me à maior parte dos cidadãos do planeta). E todos sabemos que é muito difícil tentar esboçar esquemas alternativos a um sistema extremamente burocratizado, tecnocratizado, excludente, como aquele que se está a implementar em todo o mundo.
Estamos sem horizonte, a tentar navegar sem remos numa poça que se torna cada vez mais infecta. Irrespirável. Onde a alegria genuína? Não se vê.
aqueles que passam a vida a pensar nestas coisas, e a escrever sobre elas, incorrem num risco ainda maior, o do trapezista sem rede: ou de facto de tanto ler e pensar conseguem finalmente elaborar algo de verdadeiramente "interessante", seja lá o que isso queira dizer (... em geral conotado com o "original" de múltiplas formas, a maior parte das quais pseudo-novas e portanto de certo modo caricatas, porque o que é novo é mesmo raro, esquivo como tudo... daí que quem faz um blogue destes arrisque todos os dias uma certa "má figura", mas pronto!), ou fazem um número mal feito, jamais atingindo os aplausos do público, presente ou futuro. Trapezistas ou palhaços, estão sempre a cair, e muitas vezes não se dão conta disso, continuando o número, pateticamente.
Como se dizia dantes aos pobrezinhos que pediam esmola: "tenha paciência..."
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