quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Portela, Lisboa

Como se sabe, o aeroporto da Portela (nos cinzentos tempos da minha adolescência e juventude, lugar mítico onde íamos "ver os aviões" e sonhar com o dia maravilhoso em que partiríamos daqui...) fica hoje no coração da cidade de Lisboa. Caso raro, sobretudo numa grande capital europeia.
De tal modo assim é que um dia, estávamos eu e a minha mulher para descolar para Nova Iorque, num avião grande com os motores no máximo, à espera de vez. Ao pormo-nos na fila de espera, e vendo casas, bairros próximos, vida quotidiana, pessoas a passar fora da vedação, comentou um americano para a mulher: "olha, antes mesmo de partirmos ainda nos fazem uma última "visita" à cidade, que engraçado."

Não estudei com o detalhe necessário mínimo estes problemas de planeamento e ordenamento do território. Mas, um aeroporto no centro da cidade não é coisa que se admita, com uma rota de aproximação à pista a passar por cima de Alvalade (quase podia dizer adeus do avião à família se esta estivesse à janela), da Cidade Universitária, Hospital de Santa Maria, Torre do Tombo, etc. É absurdo, para qualquer cidadão comum.
Para além destes aspectos algo anedóticos, há todo um enquadramento interdisciplinar que ignoro, mas que, como arqueólogo e como português, não deveria ignorar. Falta de tempo, pois. Mas na verdade, numa sociedade de mobilidades, os aeroportos (centrais ou locais), os caminhos de ferro (incluidndo o TGV), as auto-estradas, ou seja, a rede de circulação dentro e para fora do território é um assunto fundamental para a própria construção da identidade do país, para não falar da sua economia e do seu ordenamento e "governância" geral. É um problema estratégico que ultrapassa Portugal e interesses locais, e que se projecta em décadas para o futuro.
Uma questão crucial é evidentemente a das interfaces dos vários transportes e do cálculo de custos de acessibilidades e movimentação de pessoas e bens. Numa sociedade em que o avião se está progressivamente a tornar tão corriqueiro como o comboio ou o autocarro, eu quero sair de minha casa, ou perto, se possível num transporte colectivo, ou deixando o carro num parque acessível, para poder tomar o metro, ou um comboio ou um autocarro ou um avião em condições económicas e confortáveis. Esse é um aspecto crucial da utilização do tempo.
Parece que no Porto (cujo aeroporto é excelente) o metro já lhe dá um acesso muito bom; ainda não experimentei.
O assunto em geral é muito complexo. Mas satisfez-me ler hoje uma crónica do Público (p. 41 - secção Espaço Público) em que o comandante reformado da TAP e director da Escola de Ciências Aeronáuticas da Universidade Lusófona, J. A. Sousa Monteiro, reflecte, com a sua experiência, sobre quais teriam sido as consequências do acidente de Heathrow do dia 17 passado se tivesse acontecido em Lisboa. Parabéns, senhor comandante, por esta intervenção de quem conduziu muitos aviões, sabe do que está a falar e percebe aquilo que salta à vista: Lisboa não pode estar sob a ameaça constante de uma desgraça horrível deste tipo.
Há muito que outro aeroporto e outras infra-estruturas conexas deveriam existir, como é óbvio. Por isso, quando ouço falar da expressão "Portela" ou "Portela+1", eu, mero utente, fico arrepiado.

1 comentário:

Anónimo disse...

sem palavras!!

que algum dos nossos governantes leia isto!

parabens professor