domingo, 27 de abril de 2008

privilégio das estátuas

Os séculos passaram sobre mim
Tentando alcançar-te;
Mas sempre tiveste artes de me fugir
Apesar de estarmos apenas a um passo.

Vimos nascerem e morrerem gerações
E jamais mudámos o gesto a que nos comprometemos:
A pedra fixou-nos no sublime da consumação
Que vai acontecer a seguir, e jamais se dá.

Os miseráveis mortais vieram aqui estupefactos
Contemplar este vento que nos anima, e nos torna cúmplices
Mesmo, e por causa até, da tua permanente fuga.

Assim nos amámos para sempre, envoltos nas chamas
da Impossibilidade; no calor ardoroso do Mármore,
Obedientes ao Escultor que nos eternizou, e assim
Nos condenou para sempre a este prazer imenso.

Só os humanos que nos visitam querem ir para casa
Consumar na carne o Inatingível; mas olham-nos espantados
Desta glória cuja lógica lhes escapa, desta transfiguração
Em que a paixão, para durar, teve de sair para sempre da pedra,

E dela nunca mais sair; enquanto nós, imóveis,
Vivemos eternamente esta intensidade, sem jamais
Desmanchar a atitude, o lugar altíssimo,
O ponto em que juntam as nervuras,

E em que o nosso Orgasmo sempre adiado se consuma.


Homenagem a Bernini
voj 2008

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