Quando tinha 15, 16, 17 anos, eu queria compreender o mundo, encontrar uma explicação que a educação religiosa me tinha negado (pela des-ilusão).
Podia ter tirado um curso de filosofia, ou seguir a literatura, "coisas" para que tinha jeito.
Mas, pensar o quê, escrever o quê, sem da experiência da humanidade nada saber, senão através dos livros, de forma diferida?
Pensei então na história, na arqueologia que para mim ia mais fundo e mais longe do que a história tal como era então ensinada, para me aproximar disso que me interessava, envolto em nevoeiro.
Toquei a terra (eu, um citadino que nunca se queria sujar), os materiais, aprendi a descrevê-los e a pô-los em caixas conceptuais, e um dia perguntei-me: que significado tem isto? O ser humano não está aqui. Isto está vazio de ideias. É um arquivo morto, morto, morto.
E voltei sempre à literatura, nos poucos tempos livres, sobretudo à poesia, que é para mim o cerne da literatura e da arte, e, sempre que pude, à filosofia.
Mas qual filosofia? Sei e sabia que ela é um mundo difícil, onde uma pessoa se perde e raramente se encontra (só poucos conseguem passar da fase de absorção à fase de produzirem algo de próprio), sobretudo se for muito "arrumadinha", muito "metodicozinha": um dia acorda e está numa camisa de forças conceptual. Sabe elaborar trabalhos perfeitos, dizer imensa coisa sobre o que os outros pensaram, mas onde está de facto o seu pensamento?...
Todos aqueles campos "disciplinares" são afinal bons ou maus, ciência, filosofia, arte, depende do que se faz com eles, da energia que temos em buscar nesse imenso arquivo a vida, em trazer as frases ou as coisas mortas à tona da vida sensível, ao que nos importa, ao que desejamos. AO DESEJO.
Esse acto é sempre um acto de transfiguração de cada um de nós como ser único.
A transfiguração é a coisa mais rara deste mundo.
A transfiguração é um fazer, com as coisas, com os outros, mas um fazer que dê origem a um resultado: é uma acção transformadora.
Tudo o resto na vida passa, é desperdício.
O espectáculo mais horrível não é só vermos os muitos, os muitíssimos que não têm com que se alimentar.
É vermos quase todos os outros, uma minoria privilegiada, também eles, a seu modo, a desperdiçar(em-se). Todos os dias. Incluindo eu, está claro.
Adiando o importante, com a boa justificação do urgente.
Desfazendo o encontro nos muitos desencontros dos dias, na fluidez da vida corrente. Adiando, negando o encontro com os melhores pretextos possíveis.
Esses são os verdadeiros "homo sacer" de hoje: os consumidores do lugar-comum. Ávidos do vazio que todos os dias avidamente procuram e desenvolvem, numa vida sem sentido nem projecto.
Mas como tudo é uma ilusão, e cada um de nós um fantasma (como diz Stiegler), e poucos ficam no panteão dos que verdadeiramente contribuiram para mudar qualquer coisa no que é essencial, no pensamento (mesmo que este só tenha impacte daí a séculos), who cares? Toca a viver a vidinha.
Podia ter tirado um curso de filosofia, ou seguir a literatura, "coisas" para que tinha jeito.
Mas, pensar o quê, escrever o quê, sem da experiência da humanidade nada saber, senão através dos livros, de forma diferida?
Pensei então na história, na arqueologia que para mim ia mais fundo e mais longe do que a história tal como era então ensinada, para me aproximar disso que me interessava, envolto em nevoeiro.
Toquei a terra (eu, um citadino que nunca se queria sujar), os materiais, aprendi a descrevê-los e a pô-los em caixas conceptuais, e um dia perguntei-me: que significado tem isto? O ser humano não está aqui. Isto está vazio de ideias. É um arquivo morto, morto, morto.
E voltei sempre à literatura, nos poucos tempos livres, sobretudo à poesia, que é para mim o cerne da literatura e da arte, e, sempre que pude, à filosofia.
Mas qual filosofia? Sei e sabia que ela é um mundo difícil, onde uma pessoa se perde e raramente se encontra (só poucos conseguem passar da fase de absorção à fase de produzirem algo de próprio), sobretudo se for muito "arrumadinha", muito "metodicozinha": um dia acorda e está numa camisa de forças conceptual. Sabe elaborar trabalhos perfeitos, dizer imensa coisa sobre o que os outros pensaram, mas onde está de facto o seu pensamento?...
Todos aqueles campos "disciplinares" são afinal bons ou maus, ciência, filosofia, arte, depende do que se faz com eles, da energia que temos em buscar nesse imenso arquivo a vida, em trazer as frases ou as coisas mortas à tona da vida sensível, ao que nos importa, ao que desejamos. AO DESEJO.
Esse acto é sempre um acto de transfiguração de cada um de nós como ser único.
A transfiguração é a coisa mais rara deste mundo.
A transfiguração é um fazer, com as coisas, com os outros, mas um fazer que dê origem a um resultado: é uma acção transformadora.
Tudo o resto na vida passa, é desperdício.
O espectáculo mais horrível não é só vermos os muitos, os muitíssimos que não têm com que se alimentar.
É vermos quase todos os outros, uma minoria privilegiada, também eles, a seu modo, a desperdiçar(em-se). Todos os dias. Incluindo eu, está claro.
Adiando o importante, com a boa justificação do urgente.
Desfazendo o encontro nos muitos desencontros dos dias, na fluidez da vida corrente. Adiando, negando o encontro com os melhores pretextos possíveis.
Esses são os verdadeiros "homo sacer" de hoje: os consumidores do lugar-comum. Ávidos do vazio que todos os dias avidamente procuram e desenvolvem, numa vida sem sentido nem projecto.
Mas como tudo é uma ilusão, e cada um de nós um fantasma (como diz Stiegler), e poucos ficam no panteão dos que verdadeiramente contribuiram para mudar qualquer coisa no que é essencial, no pensamento (mesmo que este só tenha impacte daí a séculos), who cares? Toca a viver a vidinha.
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