quarta-feira, 17 de janeiro de 2007

safira



aquele que escreve, mesmo a meio da noite, quando todos os outros dormem ou fornicam, é aquele que foi tomado pela desinquietação.
para esse a almofada, mesmo a do mais fofo sofá, ou o tacto da mais sedosa mulher, são apenas consolos momentâneos.
sobre uma parede que segue atrás dele, está sempre a imagem alcandorada de uma ruína, a do castelo de duíno, sobranceiro ao mar adriático; e, pousadas numa mesinha que acompanha os seus passos, as elegias de rainer maria rilke, o visionário.
essas presenças não dão sossego; podem fazer de um homem um herói ou um louco, que tudo desperdiça num momento de decisão; mas esse momento chegará, ele pressente-o.
o momento em que, abandonando família, animais domésticos e haveres, na aparência atónitos perante a sua atitude, tem de regressar, precisamente, ao âmago do seu pressentimento.
quer dizer, necessita de consagrar a palavra, habitualmente gasta no comércio dos dias, à dureza interior da pedra, às figuras que respiram a poeira sépia das salas solitárias.
estender-se nu na vertical com uma safira sobre a cabeça; preparar-se para a viagem iminente.
tu sabes.

copyright voj 2007

Fonte da imagem: página: www.mdw.ac.at/.../ exhibition/exh_duino05.htm

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