segunda-feira, 19 de fevereiro de 2007

topázio



é-me hoje possível – diz o olhar –
subir lentamente como um dia
dos teus pés até aos teus joelhos,

e contemplar
a luz das tuas pernas.

é hoje possível – diz o olhar -

sobrevoar como uma águia lenta
o domínio de vaux-le-vicomte,

e chegar a pousar
no começo das suas escadarias,

colocar a cor pétrea das asas
contra a cor pétrea dos degraus.

o azul das penas
sobre os sinais do tempo.


é hoje possível assistir
a uma seara ardendo
sobre o teu pêlo púbico,

atiçado pela luz do poente,
entre os jardins;

é possível à águia,
esticando as suas asas,

entrar nas abóbadas do ventre,

e, guiada pela matemática
que segura a tensão dos arcos,

depositar aí uma vela,

uma intenção de anjo nu
entre a majestade das estátuas,
em câmara ardente.

é possível voar, ir entre as árvores
nos corredores das áleas,

como se fosse um dia caminhando
num jardim, sem destino

apenas para contemplar
a fachada esplendorosa,
guardada de cada lado por um seio,
por uma águia, por um círio.


por um cão enrouquecido
pela saliva dos líquenes,

pela pose das peanhas,

onde as cabeleiras armadas ofuscam
a direcção dos rostos.

é possível ao olhar enlaçar o teu pescoço
como uma grinalda,

e regressar incólume
a este mundo inócuo.

é possível, a uma equação de vôo,
transportar, depositar, o núcleo
do topázio.


pousar na cama do visconde;
colocar aí, onde o poderoso financeiro
jamais se deitou,

o nódulo fulvo, aquele

cuja luz
coincide consigo mesma;

deixar contra a seda grená
do interior deserto,

contra os ecos dos passos
do passado,

a carta da inquietação,
da brevidade,

a letra da sombra.

a luva oca de tafetá.

é possivel ver-te deitada
em toda a nudez do palácio,

coincidindo ambas
as arquitecturas, na vibração uníssona
dos pináculos.

e sobre a perfeição delas,
pousar as aceradas garras,

as presas de águia,

contorcidas como os efeitos
dos buxos, como as ondulações

dos versos, simultaneamente,
meu deus,

poderosos,
e impotentes.





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