sábado, 28 de junho de 2008

Cinema e poesia: a imagem fulgurante

Manuel Gusmão em entrevista ao Público (suplemento Ípsilon de ontem, 27.6.08, p. 30):

"(...) Interessa-me a relação possível entre a imagem literária e a cinematográfica. Não é evidente à partida*, mas pode encontrar-se do ponto de vista da alucinação. Não enquanto percepção de algo que não está lá, mas como algo que constrói uma presença que não se diria que está lá traduzida. Há um surrealista belga, Paul Nougé, que a propósito do Magritte, diz que as metáforas são figuras de coisas que o artista quer que existam. Acontece muito na poesia contemporânea. Se pensarmos a que é que aquilo diz respeito, qual é o sentido literal oculto**, estragamos tudo, porque não se trata disso. O que interessa é a evidência figural que aquilo contrói, o objecto que passa a existir com aquela criação. A imagem poética pode aproximar-se aqui da cinematográfica, que tem um certo poder de insistir no lado alucinado da imagem. Há uma fulguração, uma evidência do desenho da imagem, que vem da situação típica do cinema, a sala escura, que não é a experiência que tendemos a ter hoje, com os DVD. Mas na sala escura é ainda mais evidente esse fenómeno de intensificação do fulgor da imagem."


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Os sublinhados a vermelho são meus.
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* comentário: para mim, é. VOJ
** também não acredito muito em sentidos literais ocultos... VOJ

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