sábado, 14 de julho de 2007

Castanheiro do Vento - campanha de 2007... infelizmente metade dela já passou...


Graças à adesão de voluntários nacionais e estrangeiros, apesar de todos os constrangimentos, e mais uma vez com a imprescindível colaboração da ACDR de Freixo de Numão, tem sido possível levar a cabo uma curta campanha de escavações de um mês (Julho 2007) no sítio pré-histórico de Castanheiro do Vento, Horta do Douro, Vila Nova de Foz Côa.
A zona mais elevada da colina que este sítio constitui é um "plateau" ainda em parte preservado, apesar de séculos de agricultura.
Ontem (sexta) conseguimos finalmente concretizar um velho sonho:
- perceber melhor as estruturas adjacentes à chamada "torre", designação convencional para uma entidade arquitectónica de grande porte, complexa, situada na área norte do recinto interior. Aqui temos a destacar a colaboração da nossa colega da Universidade de Leicester Lesley McFayden;
- unir a zona sul de escavação deste ano ("bastião" V e outras entidades que estão a aparecer) com a zona anteriormente referida, a norte.
Apesar do "plateau" superior de Castanheiro estar muito erosionado e afectado pela antiga agricultura (os traços de arado ocorrem nas rochas trabalhadas do afloramento xistoso já à vista) nota-se ali, como já esperávamos, uma grande complexidade de estruturas.
Ontem à tarde, um dia de bastante calor, quando estávamos em Castanheiro, várias trocas de impressões se foram dando entre os elementos da equipa.
Estas trocas de impressões são cruciais na abordagem moderna de um sítio destes, em que todos, dirigentes, alunos, trabalhadores manuais participam, afinal, de uma tarefa comum em que é muito importante o empenhamento do conjunto da equipa. Tal empenhamento só se pode dar através precisamente dessa acção conjugada e desse diálogo, vencendo a desmotivação e o cansaço em função de um entusiasmo pela pesquisa. Esse entusiasmo não é tão difícil de comunicar quanto pode parecer, se houver um bom ambiente entre os participantes.
Quem participe num processo destes, que envolve também o esforço físico e as pessoas na sua totalidade (com as suas emoções, problemas, etc.), apercebe-se da especificidade da análise arqueológica e do seu grande valor "educativo". Da importância, mesmo para os não especialistas, de participarem (não apenas visitarem sítios, em curso de escavação ou não) numa acção destas. O que se poderia fazer se as pessoas "cultas", ao menos, se apercebessem isto! Que imenso papel social a arqueologia poderia desempenhar na criação de uma "ecologia de diálogo" e de interacção em tantos planos!
Por isso menorizar ou desprezar esta actividade pode ser considerado, de facto, um "crime". O arqueólogo é aquele "cientista" que mais longa e detalhamente se debruça sobre uma parcela, por ínfima que seja, da superfície da terra. Cada sítio é diferente de outro, cada área de um sítio põe problemas novos, alguns dos quais são evidentemente comparáveis com outros, a diferentes escalas. Esse exercício mental, na sua elasticidade, é comparável ao axercício físico.
Se parar é morrer, para um arqueólogo, deixar de escavar, em termos de investigação, é a sua morte. Por isso continuamos, uns mais animados pelas surpresas da juvenilidade (que incluem, obviamente, o grande peso das relações interpessoais), outros por relações mais densas, com os outros, consigo, com os problemas. Coisas que vêm com a idade e experiência e que dão à nossa interacção com um sítio - recurso cultural público que qualquer um deve poder aproveitar - o mesmo grau de importância que tem a leitura de um bom livro, na formação da pessoa.
Aprender a ler a terra - eis o que falta a muita gente. Como se saboreia um autor, frase a frase, parágrafo a parágrafo, na sua especificidade. Para depois cada um fazer dessa leitura a sua específica experiência.

2 comentários:

Anónimo disse...

A ideia de podermos acompanhar a escavação deste sítio arqueológico online é sem dúvida excelente, sobretudo para os arqueólogos (tal como eu) que infelizmente nem sempre podem realizar a dita escavação científica. Acho que naturalmente qualquer arqueólogo sonha poder continuar a desenvolver trabalhos de investigação, como teve a oportunidade de o fazer na faculdade. Porém o mercado em Portugal no campo da arqueologia é o que todos sabem, e portanto a maioria dos profisionais (excluindo os que são docentes, os que alcançaram um lugar numa instituição pública como numa autarquia ou museu e claro os bolseiros) tem de se contentar em fazer trabalhos designados de "arqueologia de emergência ou preventiva" (que também tem a sua importância) e que são pouco compensadores e gratificantes. Só asssim poderemos sobeviver financeiramente.
Felizmente o tipo de divulgação aqui apresentada dá-nos alento para continuarmos a trabalhar.
Continuação de bom trabalho e ficamos a aguardar mais fotos e vídeos.
Sónia C.

Vitor Oliveira Jorge disse...

Obrigado pelo seu incentivo e continue atenta porque vamos procurar todos os dias (se possível) informar os nossos leitores do que se está a passar por aqui.
Se puderem visitem-nos na escavação!!!