segunda-feira, 28 de outubro de 2013

sem título

Era uma vez um homem que se tinha dedicado a abrir portas. Ele próprio não sabia como é que aquilo tudo tinha começado. Só se lembrava de que quando um dia lhe perguntaram por que é que fazia isso, não foi capaz de se recordar. Disse. Dá-me a sensação de que toda a vida tive esta obsessão de pegar em maçanetas, e dar-lhes a volta, e ver o que está do outro lado. Podia escrever um livro sobre as possíveis razões, motivações, etc., mas estou farto de inventar coisas. Estou fartinho de histórias e até de interpretações até à raiz dos cabelos. Nomeadamente de descrever ou ver descritas ou decifradas coisas encantadoras, fascinantes, quiçá inteligentes. A verdade é que sempre abri portas, e não sou propriamente porteiro, nem quero aqui reportar-me a histórias famosas de porteiros, etc., mas apenas me apeteceu registar esta atitude compulsiva. Se não explico as razões, isto é, o que estaria do lado de cá da porta, na minha cabeça, ou noutras coisas que poderiam explicar o verosímil da minha atitude, também não me vou pôr ao modo dos escritores a descrever aquilo que vi, ou seja, o que estava por detrás de cada porta aberta.
Só sei que muitas vezes levei com as portas na cara, e que uma vez me partiram os óculos porque ainda não tinha experiência, e que foi assim uma coisa um pouco surpreendente, e dolorosa, porque fiquei com os olhos cravejados de pedaços de vidro, que refletiam coisas confusas. Mas nem isso curou a minha mania, chamemos-lhe desse modo, de contra tudo e contra todos, se necessário, continuar a abrir portas. Até que de outra vez abri uma porta que dava para fora da realidade, e fiquei ali, uma infinidade de tempo, sem poder parar de estar parado. O que me deu muito jeito porque assim não foi preciso escrever mais nada.



voj out. 2013

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